Esse blog nasce da vontade de dividir experiências desse tempo trabalhando e estudando (não tanto quanto eu deveria) fotografia, luz, teoria das cores e tudo que orbita esse universo.

Pra começar, nada mais justo do que falar sobre a foto da minha sobremesa favorita, que além de tudo carrega um caminhão de boas lembranças, de momentos e pessoas especiais.

No meu modo de ver, fotografia, assim como música, é repertório. Quanto maior, maior a chance de sair de uma enrascada. E antes que alguém se apresse, obviamente é técnica, mas é também intuição, principalmente na fotografia de alimentos, já que milhares de anos de evolução moldaram o que desperta desejo na gente.

Ao contrário do que muita gente imagina, muitas vezes a luz mais esconde do que revela, e é aí que vive o poder das sombras e do contraste.

E é por isso que minha luz principal, a não ser por um motivo realmente específico e intencional, nunca vem de frente. E na maioria das situações, quanto mais difusa, melhor.

O outro segredo que não é segredo é o rebatedor, o herói sem capa. Esse brilha com força, literalmente.

A posição do prato também importa. Quanto mais intenção pra criar profundidade, melhor. O olhar passeia, aprecia e o prato respira.

A edição é como se arrumar pra uma ocasião especial: nada exagerado, aquele tapinha que realça a beleza que já tá ali (ou não rs). Começa com técnica, mas termina no feeling. O histograma aponta o caminho, faço o que precisa ser feito, menos é mais sempre, e a decisão final chega quando a foto devolve a sensação certa.

Uma tentação comum é a simetria. A vontade de puxar aqui e ali no liquify existe. Mas comida tem peso, tem volume e tem queda natural. A perfeição está nas imperfeições que fazem sentido e precisam ser respeitadas, assim como as cores, texturas, nada é por acaso.

Mas como apreciador na arte de mandar um pudim pra dentro, eu sabia que a calda tinha voz e falava alto. Dei um toque no volume na bordinha, onde a calda começa, realcei a transição e voilà. É detalhe que quase ninguém percebe conscientemente, mas muda tudo na leitura.

A essa altura, se você chegou até aqui, deve estar se perguntando o que tudo isso tem a ver com perfeccionismo. Tem tudo. Cada microdecisão da foto do pudim é exatamente onde ele mora: na fronteira entre o cuidado que agrega e a neurose que trava. E por muito tempo eu fiquei do lado errado dessa fronteira. Já engavetei mais projetos do que gostaria de admitir, voltei em ajustes que ninguém nunca perceberia, perdi o timing por dar só mais um talento ou por achar que nunca tava bom o suficiente. Desde sempre fui assim e continuo pagando as prestações dessa conta, que é alta, até hoje.

No entanto, no processo percebi também que existe uma diferença que muita gente ignora: o perfeccionismo que paralisa vs o capricho que agrega valor. O primeiro te impede de entregar. O segundo faz você entregar melhor. Muita gente vê cuidado e chama de perfeccionismo como se fosse defeito, ainda mais com essa enxurrada de discursos de produtividade. Só que capricho não é neurose. É compromisso. É entender que em qualquer expressão criativa, a primeira impressão costuma ser a única que conta, a que vai chancelar seu trabalho. Segunda chance é luxo raro.

A foto do pudim só funcionou quando aceitei as imperfeições naturais dele. O brilho irregular, o peso, a textura que não é simétrica. Por outro lado, vi que havia espaço para um ajuste, mesmo que sutil. Tudo isso faz parte. Tudo isso é verdade.

No fim das contas, quando você trabalha com arte, sua assinatura vive nos detalhes. Mesmo que 99,9% das pessoas não percebam aquele ajuste sutil na calda, eu sei que isso muda a leitura, mesmo que seja num nível quase imperceptível e talvez de maneira inconsciente.

O ponto é: saber dosar. Ser prático sem sacrificar qualidade. Entregar bem sem se torturar no processo. Respeitar o contexto, entender o que faz sentido naquele momento e ficar em paz com o que você colocou no mundo. Talvez buscar essa verdade, no trabalho e fora dele, seja o único jeito de entregar sem sofrer tanto no processo.

Uma coisa é certa, nunca é tarde pra aprender.

E se você, por acaso, tiver algum projeto, profissional ou não, quem sabe não seja a hora de dar continuidade a ele?

Quem diria, meu primeiro texto do meu primeiro blog sobre fotografia está entregue. Como dizem, o mundo capota.

Espero que gostem e, se precisarem, só me chamar.

Até!
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